O conto de Machado de Assis, intitulado Teoria do Medalhão, apresenta um diálogo entre pai e filho, na noite em que este completa vinte e um anos de idade. Nesta conversa, o pai expressa ao seu filho, por ele ter entrado, agora, em sua maioridade, a grande vontade que tem de vê-lo tornar-se um medalhão, ou seja, um homem tido como importante pela sociedade, grande e ilustre, acima da obscuridade comum. Para isso, durante uma hora, ele prescreve a conduta que o filho terá de tomar para conquistar esse grande feito.
Primeiramente, ele deverá fugir de todas as atividades que o levem a refletir e ter idéias. Seu pai o aconselha, “...reduzes o intelecto, por mais pródigo que seja, à sobriedade, à disciplina, ao equilíbrio comum” (p. 65). Por isso, nos seus discursos, Janjão, o projeto de medalhão, nunca irá acrescentar algo novo ou de sua autoria, mas sim, recorrerá a frases feitas, consagradas ao longo da História, porque “essas fórmulas têm a vantagem de não obrigar os outros a um esforço inútil” (p. 66). Também, ao ler um livro, estudo ou qualquer escrito de mestres e oficiais da ciência, nunca deve questioná-los, para assim, não correr o risco de aflorar novas idéias, além também, de ser um oficio muito tedioso e cansativo.
Um perfeito medalhão sabe como recorrer à publicidade. Fazer seu nome ser notado, através de atos que demonstrem seu grande afeto pelas instituições da sociedade, e depois, lembrado com notícias que, mesmo não tendo nenhuma importância, aludam seu nome, é parte do seu sucesso. Depois disso, ao invés de procurar as ocasiões, elas virão até ele, que será o adjetivo fundamental a elas. Janjão também poderá se apropriar da metafísica, pois, segundo seu pai, além dela apaixonar os partidos e o público, também já está formulada e pronta para o uso. Por fim, é prescrito ao futuro medalhão para ele não se arriscar na filosofia ou mesmo na ironia. O riso transmitido por ele, deve ser somente a chalaça, grande companheira dos que nada tem a dizer.
Pode-se perceber a profunda ironia de Machado de Assis, referindo-se aos “grandes homens” da sociedade, aos medalhões, como pessoas que nada criam, inovam ou arriscam. Inertes em sua arrogância, são eles que têm poder e graça na sociedade. Acredito que o pai recomenda ao filho não pensar, porque, se fosse assim, grandes chances teria ele de despertar do dogmatismo em que se encontra. Uma pessoa assim não sofre porque não pensa, mas acaba por viver a vida de outros. Para o pai de Janjão, ele está definitivamente maior. Kant discordaria. Eu também.