domingo, 21 de março de 2010


Essa eu não conhecia... E veio tão bem a calhar com meus atuais sentimentos:

"Filosofia é, em última análise, a triste arte de ficar do lado de fora das coisas"

Daquele que ainda não perdeu o posto de favorito, Mario Quintana.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Filosofia

Se penso nela, não a quero
Quando paro de pensar,
Sinto-a em volta...
Novamente,
Só mais uma vez.



É uma relação não resolvida, de nada segura. Às vezes tensa, outras apaixonante. É normal eu senti-la vazia, ou o oposto do que tanto se apologiza ser: vejo-a tão superficial... O fato é que ainda não consegui deixá-la.

terça-feira, 16 de março de 2010

Não quero me engarrafar


Já me acusaram por não terminar nada do que começo; por não insistir. Esses tempos ouvi, agora não mais em tom de acusação, que me entedio fácil, facinho. É verdade! Sou uma mulher de fases. E para os poucos anos que carrego, já foram tantas... Mas não é hora de dar nome aos bois. Só quero dizer que esse meu jeito já não me incomoda mais. Pelo contrário, veste-me bem.
Vejo tanta gente preocupada em cristalizar uma imagem. Um esforço constante por ser algo, por ser diferente. Pela famosa imagem própria (que acaba sendo tão comum...). Nas minhas fases descobri que a essa insistência rala não me ajusto: é preciso gostar de encarar o espelho, com honestidade, admitindo falhas e desafios.
Engarrafar uma "essência" pode trazer segurança; mas também monotonia. Sigo sem essa preocupação, com o desejo de que ao menos nesse aspecto não me entedie tão fácil.

domingo, 14 de março de 2010


Está poesia é para a Elis, que me perguntou se eu conhecia alguma relacionada à trancendencia na imanência. É mais imanente que transcendente. E mais cética que imanente. Mas ainda um ceticismo inspirador.


"Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que ideia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

«Constituição íntima das cousas»...
«Sentido íntimo do Universo»...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.
O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.

Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora."

Fernando Pessoa.


sábado, 13 de março de 2010

Duas notícias tristes relacionadas à leitura...

Enquanto no Brasil o preço dos livros continua caro, em Nova York eles viram caixa de pizza...

Matéria do Jornal Hoje de sexta-feira:

Moradores de Nova York abandonam livros velhos

As bibliotecas da cidade chegam a recusar doações por causa do volume de livros rejeitados. Alguns são salvos e vendidos em banquinhas de rua, outros são reciclados e viram até caixa de pizza.

De Nova York, uma das maiores metrópoles do mundo, o novo correspondente da Globo, Flávio Fachel, mostra um hábito estranho dos moradores.

Na cidade grande dos apartamentos apertados, espaço pode valer mais que cultura. Depois de uma mudança, é comum achar nos apartamentos vazios de Manhattan livros pesados e volumosos. E muita gente se muda todos os dias.

O zelador de um prédio confirma: pelo menos uma vez por mês, recolhe vários livros abandonados pelos moradores e os entrega para o lixeiro. O que ele sente quando faz isso? “É desperdício de conhecimento, uma vergonha”, ele diz.

As bibliotecas da cidade chegam a recusar doações por causa do volume de livros rejeitados que são oferecidos todos os dias. Alguns são salvos por camelôs. À noite, um deles diz que passa nas latas de lixo, seleciona livros que foram jogados fora e põe tudo à venda na calçada. Existem centenas de banquinhas espalhadas por Nova York. Alguns livros, recebem preço não muito nobre. Outros, tem melhor sorte.

Ninguém sabe exatamente quantos livros acabam ficando para trás nesse entra e sai de gente em apartamentos para alugar em Nova York.

Mas numa loja especializada em compra e venda de livros usados, nós descobrimos que, pelo menos alguns, podem ser redescobertos.

Como um que faz parte da primeira edição de ‘Alice no país das maravilhas’ e que foi avaliado em US$ 15 mil. Agora, em vez de ficar esquecido no fundo de um armário, o lugar dele é dentro de um cofre.

Mas o destino da gigantesca maioria dos livros abandonados na cidade é mesmo uma barcaça. Todos os dias, ela ajuda a recolher 1,6 mil toneladas de papel para uma usina de reciclagem.

Não é preciso caminhar muito no lixo para achar livros de química, romances populares e até livros infantis.

Eles são triturados junto com o resto dos papéis e transformados numa massa cinza que, oito horas depois, vira papelão.

Os livros podem até ter desaparecido, mas, de uma forma ou de outra, continuam ajudando a escrever uma outra página da cultura americana. Lá na usina de reciclagem, eles viram caixas de pizza, que são vendidas nas esquinas de Manhattan.


http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL1527652-10406,00-MORADORES+DE+NOVA+YORK+ABANDONAM+LIVROS+VELHOS.html


______________________________________________________________________


O assassinato do cartunista Glauco também é triste para os apaixonados pela leitura.

No site dele além de tirinhas por personagens, é disponibilizado material para colorir e aprender a desenhar.


http://www2.uol.com.br/glauco/


terça-feira, 9 de março de 2010

Visão a partir de lugar nenhum... parte I


“Tudo o que faço é parte de algo que não faço, pois sou parte do mundo”

O título é provocativo, afinal, partir o olhar de lugar nenhum é o mesmo que ficar sem chão. Entretanto, parece-me improvável levar a noção de “lugar nenhum” a sério na prática, pois partir de algum lugar é o que possibilita a ação.

Enfim, comecei a leitura do livro de Thomas Nagel, Visão a Partir de Lugar Nenhum (The View From Nowhere) que será discutido no grupo de pesquisa Quíron. No capítulo que trata da liberdade, Nagel provoca a discussão em torno da relação subjetividade e objetividade, mais especificamente, na ação moral pelo viés externo. Ele toca no conflito determinismo versus liberdade, tema corrente em visões naturalistas do ser humano.

Descrever a ação sobre o ponto de vista externo significa entendê-la dentro da causalidade da natureza. Ou seja, o ser humano é um ser natural, tanto quanto um gato, uma cambacica ou uma lagartixa: suas ações são determinadas porque fazem parte do mundo.

Essa concepção leva ao ceticismo, pois perde-se a concepção absoluta de liberdade, e com ela a responsabilidade. O conflito entre a visão interna do agente (de que age com liberdade, sendo autônomo e, portanto, responsável perante os outros pelos seus atos) e a visão externa (de que suas ações foram tais por causa e efeito no mundo) está em jogo.

Denomina-se compatibilismo a tentativa de resolver o conflito sem a necessidade de escolher entre uma das visões. Nagel, porém, alerta para o fato de que as explicações nesse sentido não eliminam o sentimento de impotência ocasionado quando realizado o distanciamento. De fora, somos animais dentro da cadeia natural; de dentro temos a crença e o desejo de autonomia.

Autônomo é quem tem age por escolhas, sem influência das circunstâncias. As escolhas, por sua vez, são feitas por razões. Mas toda ação tem razões, que podem ser boas ou ruins. Como afirma Nagel: “As más razões também são razões” (p.192). Portanto, encontramos razões tanto para a escolha A quanto para a B. Há razões tanto para aceitar quanto para recusar um emprego: a pergunta é por que a pessoa aceitou o emprego pelas boas razões e não o recusou pelas más razões em aceitá-lo. A questão é entender o que motiva determinada ação.

O fim da liberdade acarreta também o fim da responsabilidade. Quando fazemos um juízo de responsabilidade sobre um agente, nos colocamos em seu lugar para avaliar as alternativas que dispunha. Adquirimos assim uma compreensão interna da situação. Mais uma vez, quando nos projetamos objetivamente e vemos o sujeito como parte integrante do mundo (alguém que está dentro do mundo, não que apenas o observa de modo independente) o ponto de vista interno carece de sentido.

Nagel parte de algum lugar, sua argumentação é a do dualismo mente-cérebro, que defende que os processos mentais não podem ser reduzidos ao físico, ou seja, ao cérebro propriamente dito. No blog Filosofia da Mente no Brasil, João Teixeira, ao tratar dessa mesma obra, ilustra bem a posição dualista:

"Como poderíamos, por exemplo, descrever o gosto do sal para alguém que nunca o experimentou? Certamente qualquer descrição seria redundante e, no máximo, o que poderíamos dizer é que o gosto do sal é “salgado”. A descrição aproximada do gosto do sal pressupõe, como pano de fundo, uma experiência comum partilhada por duas pessoas, sem o que ele permaneceria inescrutável – tão inescrutável quanto as experiências subjetivas do morcego." (http://www.filosofiadamente.org/content/view/7/12/)

O conflito entre liberdade e necessidade é tanto existencial como acadêmico. Uma vez que paramos para pensar sobre isso nossas “visões” são abaladas. Da mesma forma, este é um problema que a perspectiva naturalista deve enfrentar. Como simpática a esta perspectiva é alegre (sim, por que não?) que inicio a leitura de Nagel, mas agora somente com essas palavras a oferecer.