segunda-feira, 8 de novembro de 2010

"Acho que na sociedade atual nos falta filosofia"  
Frase atribuída a José Saramago

A filosofia, ou pela filosofia, olhamos o mundo com outros olhos. É inevitável uma mudança de pensamento. Uma mudança no modo de ser e encarar as coisas.

Posso estar enganada. Pode ser que qualquer curso que faria (ou não fazer nenhum curso) mudaria em algo na minha vida. Acho que sim, na realidade. Mas, ainda acho que a filosofia te muda de um jeito único; porque é seu objeto de investigação o mundo! As relações que os homens têm no mundo.

Filosofia, não importa se política, filosofia da ciência ou da linguagem, filosofia moral; a filosofia muda as tuas lentes.

Ou não! Pode ser que eu esteja enganada, não tenho mesmo certeza de nada disso que escrevi. Talvez o que falta na sociedade atual não é filosofia, mas algo bem mais simples: falta vida.



segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Papagaios livres



Hoje vi dois papagaios voando
Passaram ao alto,
Voando e cantando.
Griii, Griii...
Grii, Grii...
Foi a primeira vez que gostei de ver papagaios;
Também foi a primeira vez que gostei de como ouvi suas vozes,
Conversavam com suas próprias palavras.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Problemas da Filosofia de nosso tempo


         A partir da leitura dos textos de Stegmüller e Nunes, junto a outras leituras realizadas ao longo do curso de Filosofia, bem como a minha perspectiva como pessoa, posso dizer que os problemas da filosofia hoje refletem os resultados de acontecimentos históricos ocorridos no início e metade do séc. XX, como as segundas guerras mundiais e o advento da tecnologia. Os filósofos de hoje analisam as conseqüências sociais e científicas de acontecimentos tão poderosos, tentando tecer assim o que é importante para uma humanidade que hoje se encontra entre a total falta de regras (o tudo vale) e conhecimentos e leis cada vez mais rigorosos.  Neste ponto entra o destaque de Nunes em relação às duas espécies de contemporaneidade: uma estática e horizontal e outra dinâmica e verbal. Temos assim a sincronia e diacronia de tempos; alguns problemas de nossos dias são contemporâneos aos do início do séc. XX, mas algumas abordagens e perspectivas em relação a eles são diferentes.
            Uma característica importante é que do mesmo modo que a ciência deixou de se concentrar na filosofia durante a modernidade, fragmentando-se e especializando-se em diversas áreas, a filosofia segue o mesmo movimento, recebendo contornos distintos nos seus problemas e modos de abordagem: perde-se até mesmo uma definição concreta do que seja filosofia. As suas correntes podem dialogar com as ciências naturais e exatas (problema do valor e estrutura do conhecimento científico), com as ciências humanas (existência social e individual; a validade da cultura, da sociedade e da história). A filosofia pode também ser um diálogo do sujeito consigo mesmo, a partir da questão da consciência do sujeito nas suas relações com o mundo, na sua existência.  Esses temas recebem tratamentos distintos, mas também aparecem interligados, como na bioética, por exemplo, que caracteriza-se como uma área de investigação sobre problemas éticos que surgem na sociedade atual, como o uso de nanotecnologia ou de células tronco; assim como dá novos olhares a problemas que já existem a mais tempo, como a eutanásia ou o aborto. Na bioética entrelaçam-se problemas de ciência e tecnologia, ética e existência. É interessante que não são só filósofos que fazem bioética, mas também cientistas, religiosos, juristas, grupos de minorias e médicos. Com isso, os comitês de bioética são compostos de forma multidisciplinar.
            Esse para mim é o destaque para os problemas da filosofia hoje. É na bioética que se encontram analisados uma parcela importante dos problemas da sociedade. Porém, a filosofia não se reduz a isso. Hoje há releituras do racionalismo com auxílio da neurociência, investigações sobre os seres humanos pela psicologia evolucionista, conhecimento da linguagem humana com as lógicas alternativas e a pragmática; as relações entre ser sujeito e ser indivíduo em uma sociedade pós “11 de setembro”, marcada pelo excesso de consumo e virtualidade das relações (as análises de uma sociedade hiper moderna), a política que surge na era da cibernética e da cada vez mais tênue linha entre vida privada e legislação.
Ao contrário do que afirma Stegmüller, de que seria desejável “reservar a palavra [filosofia] para uma atividade de algum modo rigorosamente definida” (p. 14), acredito que o estudo e a atividade filosófica só têm a ganhar em revitalização, campo e formas de abordagem, mesmo que muitos profissionais neguem que o que seu “vizinho de porta” faça seja de fato filosofia: enquanto houver pessoas interessadas na filosofia, dedicando seu tempo e seus esforços a um problema e transformando-os/relendo-os como questões de seu tempo, sempre haverá espaço na filosofia; e, é claro, a tão saudável transformação de ideias.
*texto escrito para a cadeira de Filosofia Contemporânea

quinta-feira, 29 de julho de 2010




"A arte de viver é simplesmente a arte de conviver ... simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!"

Mário Quintana








Continua a ser meu favorito!

Uma singela homenagem ao  poeta que dia 30 comemoraria 104 anos.

sábado, 17 de julho de 2010


18:00

Como um floco de neve, numa fria tarde de inverno;

Assim como as nuvens negras ao entristecer da tarde, encontram no silêncio do sol poente o seu fim;

Na noite calada e fria ainda caem os flocos de neve, refletidos sobre a fraca luz da lua,

Que junto com algumas poucas estrelas dançam uma valsa há muito esquecida;

Ao som de uma sinfonia silenciosa, os flocos de neve dançam solenemente, sobrevivem ao sol poente, o apagar das luzes do universo, iluminados por estrelas, que, como velas fracas, refletem suavemente a escuridão por entre as brumas da noite;

Mas os flocos de neve estão lá, e sempre estarão, mesmo quando o sol esconder toda a escuridão;

Os flocos de neve trarão consigo a memória, esta, escondida no lado escuro da lua, que reflete a luz da vida;

A mesma lua negra e fria que surge toda a noite;

Refletida nos flocos de neve, para iluminar a escuridão...


(texto escrito há bastante tempo, que eu acabei encontrando nesse frio anoitecer de julho.)

terça-feira, 27 de abril de 2010

"Hoje eu quero sair só"

Eu gosto de pessoas introvertidas.
Quando ouço falar bem de uma pessoa, é normal ouvir um "ela é super extrovertida; é ótima!"
Nunca ouvi, "ela é ótima, uma pessoa introvertida". Sim, a extroversão é uma habilidade social e política. Muito útil, por sinal. Ela diverte.
A introversão é normalmente vista como algo ruim, e a pessoa que traz consigo essa característica passa por arrogante, anti-social. Mas no momento de ficar sozinho, o extrovertido pira, e a introversão se mostra bela. Aliás, ter momentos de solidão é uma necessidade para o introvertido: é o seu ato simples de recarregar as energias.
Enfim, eu só queria dizer que é bom conviver com pessoas introvertidas também. Quando "elas" deixam, é claro!

Como diz Lenine, "hoje eu quero sair só, não demora eu tô de volta".

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Seguir em direção a tudo que amamos



"Quando saia de casa
percebeu que a chuva
soletrava
uma palavra sem nexo
na pedra da calçada.

Não percebeu
que percebia
que a chuva que chovia
não chovia
na rua por onde
andava.

Era a chuva
que trazia
de dentro de sua casa;
era a chuva
que molhava
o seu silêncio
molhado
na pedra que carregava.

Um silêncio
feito mina,
explosivo sem palavra,
quase um fio de conversa
no seu nexo de rotina
em cada esquina
que dobrava.

Fora de casa,
seco na calçada,
percebeu que percebia
no auge de sua raiva
que a chuva não mais chovia
nas águas que imaginava."

Chuva Interior, Mário Chamie.

O poema e o poeta conheci essa semana, pelo filme A Via Láctea. Um filme que não conta uma história, mas acontecimentos e sentimentos cotidianos da vida urbana, o caos, a solidão. O trânsito congestionado, assaltado e surpreendido traduz o que no dia a dia acabamos por transformar nossas vidas. Cada um por si querendo avançar nesse mundo esgotado. Mas também encontramos nas paradas e nos motivos do movimento os laços de amor e empatia, as pequenas felicidades daqueles momentos bobos que são no final o que mais vale a pena, o gosto de se fazer o que se gosta com quem se ama e aos que de algum modo nos tocam.

"Seguir em direção a tudo que amamos" se torna ainda mais intenso quando ao final do filme quando voltamos à nossa realidade.

domingo, 4 de abril de 2010

Ao longe, consigo ouvir a música.


Esse texto eu escrevi quando estava no Ensino Médio. Foi com Música ao Longe que descobri um dos meus escritores favoritos. Achei uma edição bem bonita dele mês passado, e hoje encontrei o resumo que escrevi. É um pedacinho de mim de que eu gosto.


Música ao Longe, terceira obra de Érico Verissimo, é a continuação de Clarissa. Neste trabalho pretende-se analisar os personagens principais, os conflitos e a caracterização da época a partir do ponto de vista do autor.
Clarissa, a personagem principal, é uma jovem professora de dezesseis anosque dá valor às pessoas e seus sentimentos. Vasco, primo de Clarissa, é visto como um rebelde por todos, apenas tia Zezé (sua avó) o compreende. João de Deus é o pai de Clarissa, filho do famoso general Olivério. É um homem impregnado por tradicionalismo, junto com seus irmãos, Jovino e Amâncio.
A história se passa em Jacarecanga, interior do Rio Grande do Sul. Clarissa volta de Porto Alegre mais madura e pensativa. Relata em seu diário as desilusões com sua família, o problema com seu pai desempregado e orgulhoso, a mãe que não lhe dá carinho os tios viciados e o envelhecimento das pessoas ao seu redor. Dá importante relevância a sua infância, quando era feliz, sem distinções políticas e sociais entre seus amigos. Torna-se amiga de Vasco, passando a conhecer verdadeiramente seu primo, desenvolvendo grande afeição e curiosidade por ele.
Na obra, escrita em 1935, Érico Verissimo descreve a vida de diferentes classes sociais no interioir do Rio Grande do Sul. Com a decadência dos Albuquerque e a prosperidade dos Gamba, é relatado o declínio da sociedade movida por tradicionalismo e a riqueza conquistada pelos imigrantes italianos.
Música ao Longe mostra a rotina que gira em torno de bens materiais, enquanto que Clarissa, Vasco e Leocádio mostram maior importância para o caráter das pessoas. A obra apresenta a necessidade da felicidade em coisas verdadeiras, enquanto que se vive e envelhece.

domingo, 21 de março de 2010


Essa eu não conhecia... E veio tão bem a calhar com meus atuais sentimentos:

"Filosofia é, em última análise, a triste arte de ficar do lado de fora das coisas"

Daquele que ainda não perdeu o posto de favorito, Mario Quintana.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Filosofia

Se penso nela, não a quero
Quando paro de pensar,
Sinto-a em volta...
Novamente,
Só mais uma vez.



É uma relação não resolvida, de nada segura. Às vezes tensa, outras apaixonante. É normal eu senti-la vazia, ou o oposto do que tanto se apologiza ser: vejo-a tão superficial... O fato é que ainda não consegui deixá-la.

terça-feira, 16 de março de 2010

Não quero me engarrafar


Já me acusaram por não terminar nada do que começo; por não insistir. Esses tempos ouvi, agora não mais em tom de acusação, que me entedio fácil, facinho. É verdade! Sou uma mulher de fases. E para os poucos anos que carrego, já foram tantas... Mas não é hora de dar nome aos bois. Só quero dizer que esse meu jeito já não me incomoda mais. Pelo contrário, veste-me bem.
Vejo tanta gente preocupada em cristalizar uma imagem. Um esforço constante por ser algo, por ser diferente. Pela famosa imagem própria (que acaba sendo tão comum...). Nas minhas fases descobri que a essa insistência rala não me ajusto: é preciso gostar de encarar o espelho, com honestidade, admitindo falhas e desafios.
Engarrafar uma "essência" pode trazer segurança; mas também monotonia. Sigo sem essa preocupação, com o desejo de que ao menos nesse aspecto não me entedie tão fácil.

domingo, 14 de março de 2010


Está poesia é para a Elis, que me perguntou se eu conhecia alguma relacionada à trancendencia na imanência. É mais imanente que transcendente. E mais cética que imanente. Mas ainda um ceticismo inspirador.


"Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que ideia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

«Constituição íntima das cousas»...
«Sentido íntimo do Universo»...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.
O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.

Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora."

Fernando Pessoa.


sábado, 13 de março de 2010

Duas notícias tristes relacionadas à leitura...

Enquanto no Brasil o preço dos livros continua caro, em Nova York eles viram caixa de pizza...

Matéria do Jornal Hoje de sexta-feira:

Moradores de Nova York abandonam livros velhos

As bibliotecas da cidade chegam a recusar doações por causa do volume de livros rejeitados. Alguns são salvos e vendidos em banquinhas de rua, outros são reciclados e viram até caixa de pizza.

De Nova York, uma das maiores metrópoles do mundo, o novo correspondente da Globo, Flávio Fachel, mostra um hábito estranho dos moradores.

Na cidade grande dos apartamentos apertados, espaço pode valer mais que cultura. Depois de uma mudança, é comum achar nos apartamentos vazios de Manhattan livros pesados e volumosos. E muita gente se muda todos os dias.

O zelador de um prédio confirma: pelo menos uma vez por mês, recolhe vários livros abandonados pelos moradores e os entrega para o lixeiro. O que ele sente quando faz isso? “É desperdício de conhecimento, uma vergonha”, ele diz.

As bibliotecas da cidade chegam a recusar doações por causa do volume de livros rejeitados que são oferecidos todos os dias. Alguns são salvos por camelôs. À noite, um deles diz que passa nas latas de lixo, seleciona livros que foram jogados fora e põe tudo à venda na calçada. Existem centenas de banquinhas espalhadas por Nova York. Alguns livros, recebem preço não muito nobre. Outros, tem melhor sorte.

Ninguém sabe exatamente quantos livros acabam ficando para trás nesse entra e sai de gente em apartamentos para alugar em Nova York.

Mas numa loja especializada em compra e venda de livros usados, nós descobrimos que, pelo menos alguns, podem ser redescobertos.

Como um que faz parte da primeira edição de ‘Alice no país das maravilhas’ e que foi avaliado em US$ 15 mil. Agora, em vez de ficar esquecido no fundo de um armário, o lugar dele é dentro de um cofre.

Mas o destino da gigantesca maioria dos livros abandonados na cidade é mesmo uma barcaça. Todos os dias, ela ajuda a recolher 1,6 mil toneladas de papel para uma usina de reciclagem.

Não é preciso caminhar muito no lixo para achar livros de química, romances populares e até livros infantis.

Eles são triturados junto com o resto dos papéis e transformados numa massa cinza que, oito horas depois, vira papelão.

Os livros podem até ter desaparecido, mas, de uma forma ou de outra, continuam ajudando a escrever uma outra página da cultura americana. Lá na usina de reciclagem, eles viram caixas de pizza, que são vendidas nas esquinas de Manhattan.


http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,MUL1527652-10406,00-MORADORES+DE+NOVA+YORK+ABANDONAM+LIVROS+VELHOS.html


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O assassinato do cartunista Glauco também é triste para os apaixonados pela leitura.

No site dele além de tirinhas por personagens, é disponibilizado material para colorir e aprender a desenhar.


http://www2.uol.com.br/glauco/


terça-feira, 9 de março de 2010

Visão a partir de lugar nenhum... parte I


“Tudo o que faço é parte de algo que não faço, pois sou parte do mundo”

O título é provocativo, afinal, partir o olhar de lugar nenhum é o mesmo que ficar sem chão. Entretanto, parece-me improvável levar a noção de “lugar nenhum” a sério na prática, pois partir de algum lugar é o que possibilita a ação.

Enfim, comecei a leitura do livro de Thomas Nagel, Visão a Partir de Lugar Nenhum (The View From Nowhere) que será discutido no grupo de pesquisa Quíron. No capítulo que trata da liberdade, Nagel provoca a discussão em torno da relação subjetividade e objetividade, mais especificamente, na ação moral pelo viés externo. Ele toca no conflito determinismo versus liberdade, tema corrente em visões naturalistas do ser humano.

Descrever a ação sobre o ponto de vista externo significa entendê-la dentro da causalidade da natureza. Ou seja, o ser humano é um ser natural, tanto quanto um gato, uma cambacica ou uma lagartixa: suas ações são determinadas porque fazem parte do mundo.

Essa concepção leva ao ceticismo, pois perde-se a concepção absoluta de liberdade, e com ela a responsabilidade. O conflito entre a visão interna do agente (de que age com liberdade, sendo autônomo e, portanto, responsável perante os outros pelos seus atos) e a visão externa (de que suas ações foram tais por causa e efeito no mundo) está em jogo.

Denomina-se compatibilismo a tentativa de resolver o conflito sem a necessidade de escolher entre uma das visões. Nagel, porém, alerta para o fato de que as explicações nesse sentido não eliminam o sentimento de impotência ocasionado quando realizado o distanciamento. De fora, somos animais dentro da cadeia natural; de dentro temos a crença e o desejo de autonomia.

Autônomo é quem tem age por escolhas, sem influência das circunstâncias. As escolhas, por sua vez, são feitas por razões. Mas toda ação tem razões, que podem ser boas ou ruins. Como afirma Nagel: “As más razões também são razões” (p.192). Portanto, encontramos razões tanto para a escolha A quanto para a B. Há razões tanto para aceitar quanto para recusar um emprego: a pergunta é por que a pessoa aceitou o emprego pelas boas razões e não o recusou pelas más razões em aceitá-lo. A questão é entender o que motiva determinada ação.

O fim da liberdade acarreta também o fim da responsabilidade. Quando fazemos um juízo de responsabilidade sobre um agente, nos colocamos em seu lugar para avaliar as alternativas que dispunha. Adquirimos assim uma compreensão interna da situação. Mais uma vez, quando nos projetamos objetivamente e vemos o sujeito como parte integrante do mundo (alguém que está dentro do mundo, não que apenas o observa de modo independente) o ponto de vista interno carece de sentido.

Nagel parte de algum lugar, sua argumentação é a do dualismo mente-cérebro, que defende que os processos mentais não podem ser reduzidos ao físico, ou seja, ao cérebro propriamente dito. No blog Filosofia da Mente no Brasil, João Teixeira, ao tratar dessa mesma obra, ilustra bem a posição dualista:

"Como poderíamos, por exemplo, descrever o gosto do sal para alguém que nunca o experimentou? Certamente qualquer descrição seria redundante e, no máximo, o que poderíamos dizer é que o gosto do sal é “salgado”. A descrição aproximada do gosto do sal pressupõe, como pano de fundo, uma experiência comum partilhada por duas pessoas, sem o que ele permaneceria inescrutável – tão inescrutável quanto as experiências subjetivas do morcego." (http://www.filosofiadamente.org/content/view/7/12/)

O conflito entre liberdade e necessidade é tanto existencial como acadêmico. Uma vez que paramos para pensar sobre isso nossas “visões” são abaladas. Da mesma forma, este é um problema que a perspectiva naturalista deve enfrentar. Como simpática a esta perspectiva é alegre (sim, por que não?) que inicio a leitura de Nagel, mas agora somente com essas palavras a oferecer.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Kant sobre "quem se acha"

Kant pode ser duro e meio piegas, mas também sabe dar umas cutucadas:

"Se porém alguém fala e decide como um gênio até em assuntos da mais cuidadosa investigação da razão, então torna-se completamente ridículo; não se sabe bem se se deve rir mais do impostor que difunde tanto fumo em torno de si e em que não pode ajuizar nada claramente, mas muito mais se imagina, ou se se se deve rir mais do público, que candidamente imagina que a sua incapacidade de reconhecer e captar claramente a obra-prima da perspiciência provém de que verdades novas lhe são lançadas às mãos cheias e contra o que a minúcia (através de explicações pontuais e exame sistemático dos princípios) lhe parece ser somente obra de ignorante."

Crítica da Faculdade do Juízo, p. 215.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Apessoando-se.



Texto escrito a partir do desafio de Martha Medeiros e Maggie Sander.

Sou difícil de começar, então parto da estação: sou primavera, sempre fui, a cada ano confirmo.

Sou café da manhã demorado, com cheirinho de mel no pão torrado, com um toque de café preto. Fesco, claro!

Sou mamão com aveia, banana com granola, suco com o que tiver.

Sou do chima solito pela manhã, e do chima companheiro a qualquer hora.

Ninguém acredita, mas digo que sou bolsista e trabalho. Adoro o que faço, mas nem sei direito o que é, muito menos explicar.

Sou Erico Veríssimo de coração, Saramago de cabeça, Hume de filosofia, Kant de brincadeira. Sou Bakunin de utopia e Quintana cotidianamente. No fundo sou Peanuts, e uma Mafalda bem mais contida.

Sou filme em qualquer lugar, menos no computador. Sou Seinfeld e That´s 70´s show, sou Big Bang Theory. Sou blockbusters para os outros, cinema alternativo e TVE para mim.

Sou ave, cachorro, tartaruga, mar, céu, ar, terra. Não sei ser algo único da natureza, sou toda ela. Sou brincar na lama, tomar banho de chuva, pular cachoeira, rolar na grama. Não tenho como evitar, adoro cachorro, mas sou gato. Sim, sou contraditória como todos os humanos. Sou lagartixa. Volúvel demais.

Sou preguiça depois do almoço, preguiça de tomar banho, preguiça de acordar. Sou a economia em pessoa, menos ao fofocar.

Sou vinho rose, sou cara lavada, cabelo nem tanto. Gosto tanto da minha cor que sou filtro solar 30, chapéu e sombra. Sou da praia da calmaria, do banho de mar, de ver o sol nascer e comer crepe. Ah! Sou doce, doce e doce.

Sou sorvete de uva, negrinho de colher, pipoca de panela; doce. Mas não me dê café com açúcar, sou também do equilíbrio.

Não sou do churrasco, mas sou gaúcha no sentido amplo; não sou apenas do Rio Grande do Sul, sou de Colônia, da erva pura folha, do monte caído. Dançar TNT até não se aguentar mais.

Sou das Cordilheiras dos Andes, dos sebos, dos brechós, das flores e hortas. Sou de tudo isso junto ao mesmo tempo.

Não sou estrela de rock, não sou genial, muito menos sábia. Não sou cool, cult, nerd, militante. Mas também não sou careta, poser, beatnik, bitolada. Uso, mas não gosto de rótulos e estereótipos.

Sou do imanente; tiro o sentido da vida na aceitação de que vivê-la é o seu sentido. Não tenho fé, mas não sou intolerante. Sou tudo o que escrevi, mas talvez não tudo. Certamente tudo que sou não escrevi. Se sou mentirosa? Não, apenas um pouco tímida e inacabada.

Nesse meio tempo já fui tanta coisa mais... Sou risada interna para piadas, e demora em compreendê-las. Sou dificuldade em sorrir em fotos, e jogos de tabuleiro. E por ai vai, os íntimos que sabem mais! O bacana dessa atividade é voltar-se a si, bem no clima do post anterior.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Leitura de verão... Divã, de Martha Medeiros



Engraçado eu me motivar a ler um livro com esse nome, mas há dois culpados: eu gosto da autora e gostei do filme. Mercedes é uma mulher de meia idade que ainda não achou seu "eu"; e voltando-se a si, parte em sua busca, usando a boa e velha verbalização. É uma jornada pessoal, existencial.
O que me trouxe identificação foi a sua descoberta> quis tanto encontrar-se que se viu nos outros, na convivência que dá graça a vida. Pelas diferenças, assumimo-nos, pelas igualdades, nos fortificamos. Nas risadas compartilhamos e nas confissões nos ligamos. Deve ser por isso que a saudade é tão devastadora; uma parte do que nos faz ser, não está.
Como se trata de alguém expondo e construindo ideias, Mercedes(ou Martha) fala sobre medos, família, sexo, sociedade... Enfim, dos montes de pensamentos que povoam nossas mentes. A seguir algumas partes deliciosas:

“Sou tantas que mal consigo me distinguir. Sou estrategista, batalhadora, porém, traída pela comoção. Num piscar de olhos fico terna, delicada. Acho que sou promíscua, doutor Lopes. São muitas mulheres numa só, e alguns homens também. Prepare-se para uma terapia de grupo”.

“Alguém um dia disse que o homem está condenado a ser livre, acho que foi Sartre. Tem sido dilacerante para mim aceitar que a vida sem laços é a única liberdade possível. E se não for? E se Sartre estiver redondamente enganado, e a liberdade for, ao contrário, a mescla com outras vidas, e se a liberdade for o autoconhecimento gerado pela convivência, não pela reclusão, e se tudo o que eu li e vivi até hoje foi desperdiçado por essa minha busca idiota por uma verdade soberana?”

“Queria poder dizer a essa mulher de pernas cruzadas e costas eretas que se ela fosse realmente minha amiga estaria estirada no sofá, com as pernas em cima da mesinha de centro e pedindo que eu colocasse um disco. Que se ela fizesse parte do meu mundo não estaria essa echarpe rosa-bebê nem teria exagerado tanto no perfume, e muito menos falaria o português correto.”

“Eu vejo esse pessoal com piercing na língua e na sobrancelha e me espanto com a facilidade com que eles expressão seu inconformismo, mas é um conformismo padronizado, com fotos publicadas em revista de moda. Fica datado, vira registro de época, e o que tanto os inconformou acaba sendo deixado em segundo plano. Se eu pintasse meu cabelo de rosa-choque eu me sentiria a mais careta das mortais. Eu sou rosa-choque por dentro.”

[...] A menina tem jeito, precisa apenas deixar de se levar a sério. Tem 20 anos apenas. O Renato, 21. A modernidade os alcançará lá adiante, quando não estiverem mais atrás disso.”

“Lopes, que liberdade boa essa de se desresponsabilizar pelo próprio personagem[...] A liberdade de que falo é aquela de tentar ser aquilo que ainda não tentamos”

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Unindo desenhos animados com mitologia

Esse texto eu escrevi no meu primeiro semestre do curso de filosofia. Ele devia ser um artigo de divulgação destinado à crianças, do tipo encontrado na revista Ciência Hoje das Crianças.

Mitologia Grega

Você já imaginou como era a vida das crianças bem antes de Cristo? Certamente, elas não ligavam a televisão para ver desenhos animados. Como? Não havia historinhas então? Calma! Existiam muitas histórias, que eram contadas de pessoa para pessoa.

Sabe o desenho “A Pequena Sereia”? Lembra do Tritão, o pai de Ariel? Ele já existia naquela época, nos mitos contados por gregos. Tritão era um deus marinho, representado por cabeça e tronco humanos, e cauda de peixe. Era filho de Poisedon, deus supremo dos mares. Agora pense no pai de Ariel. Ele não era o rei do mares, com uma cauda enorme de peixe?

Você também deve conhecer “Os Cavaleiros do Zodíaco”, desenho repleto de mitologias. Cinco guerreiros guiados pelo poder de uma constelação, com a missão de proteger Saori, reencarnação da deusa Atena (deusa da guerra justa e da sabedoria), enfrentando diversas batalhas, como a de Hades, por exemplo. Hades, no desenho, é o senhor das trevas, que concedia corpo físico para os mortos. Na mitologia grega, ele era o deus dos mortos. Algo em comum?

A mitologia, nesse caso, a grega, inspira e sobrevive em desenhos animados, filmes, peças de teatro e brincadeiras. Isso porque os mitos são uma forma mágica de explicar como e porque a realidade é a existente. O homem primitivo situava-se no mundo e encontrava razões para seus atos através deles. Para a pergunta de onde viemos, apresentavam a cosmogonia. Ao ver o mar agitado, diziam que Poisedon estava zangado. Ao querer explicar o amor, surgia Eros, lindo, irresistível, ignorante do bom senso. Segundo Maria Helena Martins, as raízes do mito não se acham nas explicações exclusivamente racionais, mas na realidade pré-reflexiva, das emoções e da afetividade. Afirma também que “o mito não é resultado de delírio, nem de uma simples mentira. O mito ainda faz parte da nossa vida cotidiana, como uma das formas indispensáveis do existir humano”.

Então, na próxima vez que você for para frente da telinha, preste atenção em como os desenhos tratam a realidade. E quando ouvir um nome estranho, pergunte para seus pais, para a professora ou para os livros, se esse personagem não foi inspirado por alguma lenda antiga. São valores e visões que ainda permeiam os dias atuais, deixando claro para nós que a tecnologia não inventa histórias, somente as reproduz. A mente humana cria novas máquinas, mas ainda se apóia em mitos anteriores ao cristianismo. A mitologia faz parte das bases de nossos valores e crenças, portanto, do nosso cotidiano.